quarta-feira, abril 21, 2010

Uma aldeia de Montemuro e uma história

De há uns tempos a esta parte, tornou-se-me premente escrever sobre uma aldeia situada no coração de Montemuro, a serra que, em 1940, Amorim Girão intitulou "a mais desconhecida (...) de Portugal". A ideia já vinha de longe, não consigo descortinar quando, provavelmente desde meados da década de oitenta do século passado. Era uma ideia vaga, sem contornos definidos. Um esboço romântico, apenas. Terá nascido de uma mistura de impressões causadas pela leitura de um livro da autoria de Carlos de Oliveira Silvestre que, em 1983, publicou a sua monografia Gralheira de Montemuro. À época passava eu o mês inteiro de férias numa aldeia serrana onde a minha mãe tinha nascido, e permanecido durante mais de trinta e cinco anos da sua vida. Essa aldeia tinha um nome: Gralheira. Aí serviu como criada, engravidou do filho dos patrões, foi preterida em virtude das suas origens simples e, sozinha e com uma filha nos braços, carregou o estigma de engeitada. Aí veio a casar com um moço de outra terra (Boassas), engravidou sucessivemente e deu à luz quatro outras filhas. Em busca de melhores dias, esperançada num futuro melhor, abandonou a terra que a viu nascer (e a suas filhas) e intalou-se com a família em Castro Daire. No início da década de 60, protagonizou esse fenómeno que os estudiosos designaram como êxodo rural e veio para Lisboa. Vinha em busca de um grão mínimo de felicidade, ou então fugia de uma vida de carentia e de maus tratis que não queria para si e para os seus. Desafiava o destino, uma vez mais. Regressou à sua terra dez ou onze anos depois, já sem a sua filha de solteira e com mais um rapaz pela mão. Esse rapaz era eu.